quinta-feira, 21 de junho de 2007

Um homem

Ele me pareceu mais belo
do que qualquer pessoa
naquele momento, naquele vagão,
com seu rosto marcado
e as manchas de velhice sob os cabelos brancos.
Durante quase uma eternidade olhei-o, sem discrição.
Talvez fossem as orelhas pequenas,
ou as mãos imensas, tortas, trêmulas.
Talvez a roupa azul, uniforme de menino,
o chapeuzinho de tecido pousado no colo,
ou os olhos quietos de quem já viu muito.
Talvez, quem sabe, a resposta estivesse em seus sapatos marrons,
velhos e impecáveis em seu brilho. Cheios de dignidade.
Ele desceu rapidamente na Consolação,
e eu fiquei sem saber.

quarta-feira, 20 de junho de 2007

...ainda sobre parques

Quando é que vão tirar as grades em volta dos parques e praças de São Paulo, herança da administração Jânio Quadros? Elas costumam funcionar à avessas, como a cabeça do ilustríssimo político em questão...

Da Aclimação

Notícias paroquiais, ou nem tanto: hoje li nos jornais que o Conpresp (Conselho Municipal do Patrimônio Histórico de São Paulo) vetou construções com mais de 10 metros no entorno do Parque da Aclimação, que é tombado desde a década de 80. Grande notícia!! Fiquei especialmente feliz ao saber que, com a medida, uma construtora que havia arrematado o antigo prédio do colégio Anglo Latino terá que desistir de lançar um espigão residencial coladinho no parque. A ironia é que décadas atrás o colégio teria se apropriado de áreas pertencentes ao parque, com o apoio de manobras de alguns vereadores. Quem sabe agora eles não devolvem o terreno à população? Uai, não custa sonhar! E se é pra sonhar, vamos lá: eu acho que mais do que avaliar a adequação dos imóveis dentro do plano diretor, a prefeitura deveria levar em conta, de verdade, o valor e o impacto urbanístico deles na região. Dois exemplos de absurdo aqui bem pertinho: 1) a demolição de casas antigas na Avenida Aclimação (ao lado do parque, mais uma vez) para a construção de um McDonald’s, dentro do seu padrão de ‘fast arquitetura’; 2) a construção do Shopping Metrô Santa Cruz, que no papel seria um belo prédio em estilo neoclássico, evocando as antigas estações de trem, blá blá blá, e na realidade se transformou em um monumento ao mau gosto, um caixote de concreto pré-moldado que agride a paisagem urbana, mesmo em São Paulo, e piora muito o trânsito da região.

quinta-feira, 14 de junho de 2007

5 perguntas sobre o Cristo

- Alguém que votou no Cristo para entrar no rol da 7 maravilhas do mundo moderno indicaria sem vacilar o Rio de Janeiro como destino turístico para um parente ou amigo?

- Caso o Cristo seja eleito ele vai dar uma mãozinha para mudar a situação de insegurança e de abandono na cidade por parte do poder público?

- Caso o Cristo seja eleito o brasileiro o tomará como exemplo e deixará de votar em políticos reconhecidamente corruptos e safados?

- Caso o Cristo seja eleito deixaremos de lado nossa ancestral baixa auto-estima e bunda-molice?

- Caso o Cristo seja finalmente eleito nos preocuparemos com coisas mais relevantes?

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Um feriado em Santa Rita

No último feriadão, enquanto a capital fervia com a Parada Gay na Avenida Paulista, decidimos fazer o caminho inverso e sair da cidade, depois de mais de seis meses ininterruptos sob o céu de São Paulo. Fomos para o interior, para a região de Santa Rita do Passa Quatro, antiga terra de cafezais, hoje dominada pela cana.
Na quinta-feira, logo ao chegar, nos deparamos com a procissão de Corpus Christi em volta da praça da Matriz. Um verdadeiro evento: tapete feito pelos moradores, fanfarra, fogos, palmas, gritos de ‘Viva Jesus’ e discurso do pároco garantindo que a fé no Nazareno é a solução para os problemas do mundo; não vi muitos jovens por lá, a maioria era formada por velhos, adultos e crianças.
Mas certamente os jovens estavam no show do artesão-andarilho-popstar Ventania, que aconteceu no sábado em uma linda fazenda da região. Qual é o nível máximo de BG (bicho-grilice) que você consegue imaginar? Multiplique por 10 e talvez você consiga ter uma idéia da figura de Ventania, oriundo de São Tomé das Letras, com seu chapéu de bruxo e chinelos de couro, em permanente chapação. Foi divertido ver um bando de menininhas bonitinhas se batendo para tirar foto com aquele ser definitivamente distante de qualquer padrão de beleza e totalmente siderado. No terreiro da fazenda, onde há uns 80 anos se colocava café para secar, cerca de dois mil jovens da cidade e arredores se sacudiam com a voz áspera de Ventania e sua banda no palco enfumaçado pelos baseados tamanho família. “Micróbio que se preza vive a vida a rodar/fazendo do planeta sua sala de estar/micróbio bicho doido de cabelo embaraçado tira férias o ano inteiro, vive desocupado/ micróbio não tem medo de nada/ micróóóbiiioooo...”. Curiosidade: o telão ao lado do palco não transmitia o show do micróbio, mas sim imagens de Woodstock. Surreal, você vê Jimmy Hendrix e ouve Ventania.
No domingo, ali do lado, em Tambaú, jovens e velhos finalmente se encontraram, em mais um campeonato de truco, disputado no grito por 60 duplas. Durou o dia inteiro. O primeiro prêmio era uma TV de 20 polegadas, o segundo um DVD player, e o terceiro um pacote de cerveja. Um amigo que ia participar do campeonato (fez o sacrifício de levantar cedo depois do show de sábado) me confessou que estava torcendo mesmo era para ficar com o terceiro lugar...


Um feriado em Santa Rita