segunda-feira, 7 de maio de 2007

Virada


18h do sábado, dia 5: Cinemateca, filme de Ozualdo Candeias; 21h: abará da Rota do Acarajé, na Martin Francisco; 22h30: na fila do Sesc Consolação para ver Prêt-à-Porter 9 do CPT de Antunes Filho, que deve estrear em outubro; 1h30: no Sinesesc para assistir Baixio das Bestas, de Cláudio Assis, com o trompetista Bocato dando uma canja no hall do cinema; 4h: chacoalhando com Jerson King Combo no palco montado na Avenida São João; 5h: depois de um rolê pelo centro, lanche no Ponto Chic do Largo do Paissandu; 6h49: saldo do tumulto na Praça da Sé, um carro incendiado, lojas saqueadas e pelo menos três pessoas presas; 7h: finalzinho um show de música e poesia na Casa das Rosas, lotada de gente de todas as idades; 7h30: nascer de sol esplendoroso; 8h: cama.
Confesso que não foi fácil virar a noite na rua; nos últimos anos, certamente o único motivo que me levou a atravessar 24 horas insone foi o trabalho. Estive na Virada Cultural de 2006, mas consegui agüentar só até as 4h, horário maldito em que o cansaço toma conta. No ano passado a Virada aconteceu só uma semana depois da onda de ataques do PCC, e lembro até hoje da sensação boa que tive ao ver a galera ocupando o centro da cidade na madrugada.
Achei então que era gente pra caramba, que a população tinha resolvido dar uma banana pro medo e ir para as ruas. Ao voltar para o centro na madrugada do último sábado foi que eu vi que o medo segurou as pessoas em casa no ano passado, sim, e uma minoria resolveu encarar. A quantidade de gente este ano foi muito, muito maior. Confesso que ao chegar à Avenida São João por volta das 4h, depois de circular pelo civilizadíssimo circuito Sesc, fiquei chocada com a sujeira espalhada pelo chão, com o fedor de mijo e a quantidade de adolescentes bêbados e caídos pelas sarjetas. Também me assustei com o palco de guerra na região da Sé, com carros destruídos, lojas saqueadas e a polícia prendendo, depois de distribuir bala pros mano que foram assistir o show dos Racionais.
Com tudo isso, acho que o saldo da Virada foi positivo: nunca imaginei que fosse ver, às 6h das matina, uma fila de gente ávida por cultura esperando pacientemente em frente ao Teatro Municipal, ou que pudesse ser tão bom caminhar pela Vila Buarque de madrugada, admirando a lua e a arquitetura dos prédios antigos; gostaria de ter o dom da ubiqüidade para estar em muitos mais lugares: vendo Nosferatu no cemitério da Vila Cachoeirinha, lendo poesia na Casa das Rosas, curtindo Tom Zé num céu bem distante...
Cabe ao mesmo poder público que criou esse presente para a população garantir que ela tenha onde jogar o lixo, onde fazer xixi e também oferecer segurança, em vez de espalhar o medo. Podem começar a se mexer, porque nós experimentamos a Virada e gostamos, gostamos muito, queremos mais.

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